ESPAÇO INTERIOR
13.VIII.22 – 05.XI.22
PF – @pf2119 / www.pf2119.com / plataformaflex@gmail.com
A exposição Espaço Interior de Inara Vidal reúne um conjunto selecionado de peças experienciadas a partir de suas pesquisas e vivências durante o período mais rígido de isolamento na era pandêmica. Em conversações on-line, enquanto desenvolvíamos nossas constantes dinâmicas de acompanhamento crítico mútuo para o Programa de Interlocução (2020-21), junto com o curador Bitu Cassundé de Fortaleza, a artista passou a apresentar intuitivamente uma sequência de exercícios e proposições denominada, por assim dizer, de ‘táticas de sobrevivência’. Em seus estudos ao redor de sonoridades e instrumentos feitos de barro, Inara realizou cursos com algumas técnicas tallan (pré-incaicas) com o ceramista peruano Maneno e com o argentino Hernán Vargas, músico instrumentalista que vive em Oaxaca no México, criador de esculturas para corda, sopro e percussão, e que está desenhando um projeto de fundação de toda uma orquestra. Ao longo do processo, Inara passou a buscar conhecimentos também acerca da utilização de tecnologias ameríndias pela inserção de água no manuseio de instrumentos musicais. A água é percebida como um elemento sagrado e espiritual, de purificação e transformação da vida, na maioria dos rituais, tanto nas religiões antigas, quanto na alquimia. Na exibição Espaço Interior, a menção ao bule de louça branca traz a memória das tradições europeias, e a água vai passando por entre origens de culturas ancestrais e raízes de miscigenação, evocando o som e o poder dos udus, artefatos confeccionados por Inara Vidal, e tocados por Alex Figueiredo, instrumento percussivo africano-nigeriano, abaulados e com texturas, com significado de paz em sua língua natural.
A série de apitos conta com uma característica principal, cada qual tem o seu espaço de dentro a produzir um som diferente. Na produção destes objetos não há nada que se vincule a uma noção de múltiplos, tampouco a moldes de formas pré-estabelecidas. As peças são modeladas uma a uma, como a geração vital de nós mesmos. Certas frequências de som podem curar e fazer vibrar sentimentos de coragem ou tristeza. O som de apitos muitas vezes surge associado nas sociedades ocidentais à vida coletiva urbana, tal qual eventos esportivos, controle de tráfego ou atos políticos. Nos ritos sepulcrais indígenas, apitos aparecem presentes nos túmulos para o bom agouro da passagem entre mundos. Desenhos registrados em caderno de sonhos como atividade do curso Arte, Saúde e Práticas, orientado por Elisa Castro e Daniele Machado do Rio de Janeiro, em 2021, deram conta de estimular à altura o imaginário vislumbrado por Inara para a montagem de Espaço Interior.
Uma pelve disfuncional de trás para frente, uma cabeça invertida para baixo que canta; ou a representação de um corpo fragmentado pela pandemia que nos dá a seta de nossos próprios desejos numa estranha atualidade dual: o quanto ainda estamos subjetivamente em pedaços, e de como somos ineptos para tentar nos reagruparmos à sociedade. Sem sapatos, enfim, aprendemos a nos reposicionar diante do acolhimento de uma tenda armada de projeção de vídeo, para benzimento e descanso na casa das mezuzot* (batente em hebraico, plural de mezuzá).
Marcio Harum
Curitiba, agosto de 2022
INNER SPACE
13.VIII.22 – 05.XI.22
PF – @pf2119 / www.pf2119.com / plataformaflex@gmail.com
The exhibition Inner Space by Inara Vidal brings together a selected set of pieces from her research and experiences during the most rigid period of isolation in the pandemic era. During conversations, while we developed our constant dynamics of mutual critical accompaniment for the Interlocution Program (2020-21), together with the curator Bitu Cassundé from Fortaleza, the artist intuitively began to present a sequence of exercises and propositions called, for so to speak, of ‘survival tactics’. In her studies around sounds and instruments made of clay, Inara took courses with some tallan (pre-Incan) techniques with the Peruvian ceramist Maneno and with the Argentinean Hernán Vargas, instrumentalist musician who lives in Oaxaca, Mexico, creator of sculptures for string, wind and percussion, and who is designing a foundation project for an entire orchestra. Throughout the process, Inara also began to seek knowledge about the use of Amerindian technologies for the insertion of water in the handling of musical instruments. Water is perceived as a sacred and spiritual element, of purification and transformation of life, in most rituals, both in ancient religions and in alchemy. In the Inner Space exhibition, the mention of the white ceramic teapot brings the memory of European traditions, and the water passes through the origins of ancestral cultures and roots of miscegenation, evoking the sound and power of the udus, artifacts crestes made by Inara Vidal, and played by Alex Figueiredo, an African-Nigerian percussive instrument, domed and textured, with the meaning of peace in its native language.
The series of whistles has one main feature, each one has its own space inside to produce a different sound. In the production of these objects, there is nothing that is linked to a notion of multiples, nor molds of pre-established forms. The pieces are modeled one by one, like the vital generation of ourselves. Certain sound frequencies can heal and vibrate feelings of courage or sadness. The sound of whistles is often associated in Western societies with urban collective life, such as sporting events, traffic control, or political acts. For indigenous burial rites, whistles appear in the tombs as a good omen of the passage between worlds. Drawings recorded in a dream notebook as an activity of the Art, Health and Practices course, guided by Elisa Castro and Daniele Machado from Rio de Janeiro, 2021, managed to stimulate the imagination envisioned by Inara for the creation of Inner Space.
A dysfunctional backward pelvis, an inverted head that sings; or the representation of a body fragmented by the pandemic gives us the arrow of our desires in a strange dual nowadays: how much we are still subjectively in fragments, and how inept we are to try to regroup with society. Without shoes, anyway, we learned to reposition ourselves in front of the reception of a tent set up for video projection, for blessing, and rest at the mezuzot* house (door post in Hebrew, plural of mezuzah).
Marcio Harum
Curitiba
August, 2022